A lógica de que exagerar na dose de analgésicos pode tornar a pessoa
mais resistente à dor se aplica ao veneno para o controle do mosquito
Aedes aegypti, transmissor do vírus da dengue.
Uma pesquisa da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Botucatu
aponta que o emprego excessivo de inseticidas, tanto o aplicado pelas
prefeituras quanto os usados em casa, induz o mosquito a ter uma
resistência genética maior ao veneno.
O trabalho fez o mapeamento genético de 95 mosquitos em sete cidades paulistas, com diferentes incidências de casos de dengue.
Em laboratório, também foi avaliado como o organismo das larvas do inseto respondia ao veneno.
MAPEAMENTO
A resistência dos insetos a diferentes venenos já vem sendo mapeada pelo
Ministério da Saúde e por órgãos estaduais. Em São Paulo, o
acompanhamento é feito pela Sucen (Superintendência de Controle de
Endemias).
O estudo também toma por base a série histórica dos dados de
resistência, catalogados desde 1996 em diferentes cidades pela Sucen.
A estimativa aponta, por exemplo, que, enquanto em Marília, com poucos
registros de dengue, os inseticidas públicos matavam ao menos 80% dos
mosquitos, em Santos a taxa de sucesso chegava à metade em alguns casos.
"É preciso periodicamente analisar a eficácia, porque a resistência é um
processo. O que é bom hoje pode não ser no próximo verão", diz Maria de
Lourdes Macoris, que trabalha na Sucen de Marília e é autora do estudo.
Em laboratório, foram selecionadas cerca de 150 larvas do mosquito para
cada cidade estudada. Nessa fase, a da análise bioquímica, o metabolismo
das larvas mais resistentes ao inseticida mostrou maior atividade das
enzimas do grupo das esterases, ligadas à capacidade de neutralizar o
veneno.
O estudo também analisou o material genético de 95 mosquitos, nascidos de ovos obtidos em cada um dos municípios escolhidos.
Segundo a pesquisadora, o material genético de cada grupo de mosquito
variou muito, o que revelou um baixo fluxo gênico, ou seja, pouca
mistura entre as diferentes populações do inseto.
VARIADO
Como a genética do
Aedes revelou ser muito variada de uma
localidade para outra, isso indica, de acordo com Macoris, que o
mosquito tende a se estabilizar em cada local e a desenvolver diferentes
níveis de resistência a inseticidas, conforme a exposição do animal à
substância.
Órgãos públicos já controlam o veneno, diz a pesquisadora, mas a
orientação é que, dentro de casa, o uso seja moderado. "Ainda existe
essa cultura nas pessoas de acreditar na eficácia do inseticida em
casa", afirma.
O Ministério da Saúde também alerta para o uso doméstico exagerado de inseticidas contra o mosquito.
Há 12 anos, o governo criou um sistema de monitoramento da eficácia dos
venenos aplicados. Vinte cidades paulistas foram selecionadas.
A cada dois anos, as prefeituras recolhem ovos do mosquito para serem
analisados em laboratórios da rede pública de saúde. O veneno é trocado
sempre que a taxa de resistência fica muito alta.